Jornal Pioneiro 22 de junho de 2005
Estradas
Pedágio previsto. Conservação, não
Segundo especialista, contrato permite praça na Rota sem exigir investimento
JAISSON ILTCHENCO VALIM
Caxias
do Sul - Diretor da Confederação Nacional dos
Transportes (CNT), o advogado Marcus Gravina decidiu intensificar,
nos últimos meses, os estudos sobre a concessão do Pólo
Rodoviário de Caxias do Sul. Não tardou para encontrar
equívocos espalhados pelas 30 páginas do contrato entre
a concessionária Convias e o governo do Estado.
A
última descoberta ele antecipa na entrevista que segue,
concedida na terça-feira da semana passada. Ele afirma que o
contrato prevê a instalação de uma praça
na Rota do Sol, entre Caxias do Sul e a localidade de Apanhador,
assim que a rodovia estiver concluída, mas não obriga a
empresa a conservar o trecho.
Pioneiro:
Quais as chances de instalação de pedágio na
Rota do Sol?
Marcus
Gravina: A Lei nº
10.705, que autorizou o pólo de Caxias, e o edital de
licitação não previram (a concessão de)
qualquer trecho da RST-453 (a Rota do Sol), entre Caxias do Sul e
Apanhador. Muito menos a definição da localização
da praça. Este caso traz consigo um grave arranhão no
princípio da moralidade. Acabou sendo contratado, sem nenhuma
autorização, um trecho. Mas o mais grave é que
esse contrato estabelece que foram contratados 173,75 quilômetros
da RS-122 e da BR-116, mas não o trecho da Rota. Como o
segmento não está no contrato, não obriga a
concessionária a fazer a recuperação e a
manutenção. Dá para interpretar que as
concessionárias ganham como bonificação o
direito de cobrar o pedágio nesse trecho sem ter obrigação
de conservação. O dinheiro do pedágio, supõe-se,
será para pagar a manutenção dos demais trechos.
Pioneiro: O
governador tem dito que não vai instalar a praça. Como
ele poderá impedi-la se ela está prevista em contrato?
Gravina:
Os atos da administração
passada eivados (contaminados) de ilegalidade podem ser anulados, sem
nenhum risco de indenização. O que cabe ao governador é
examinar a ilegalidade, e não esperar pela Assembléia
Legislativa para declarar nula essa cláusula e retirá-la
do contrato. O benefício que fará para toda a sociedade
é este. Poderes para isso ele tem. Senão, pode haver um
pecado por omissão.
Pioneiro:
Mas as concessionárias alegam que, se não houver a
instalação, poderá haver o desequilíbrio
econômico-financeiro.
Gravina:
Desequilíbrio
econômico-financeiro não se presume, prova-se. Não
haverá distorções se as tarifas forem calculadas
no devido tempo. Se, porventura, chegar-se à conclusão
de que o programa poderia sucumbir por falta de estudo mais apurado,
vai se dispor de quê? Do que a lei admite: a rescisão
amigável ou consensual do contrato. Mas não pode o erro
de um estudo ser suportado pelo usuário. Essa conversa de
desequilíbrio econômico-financeiro se não entrar
(a praça) é balela. Até hoje não entrou
um centavo nessa praça. E nós não estamos
falando que o contrato está desequilibrado? Evidentemente que
não vai se exigir das concessionárias se não for
dada a justa remuneração. A opinião que se criou
agora é que vamos respeitar o contrato existente e tentar
conviver com a modicidade da tarifa e das obras que sejam possíveis
de serem realizadas com o que vamos pagar.
Pioneiro:
Em que casos o governador deveria encaminhar projetos sobre os
pedágios ao Parlamento?
Gravina:
A administração deve ter
o zelo de não submeter à Assembléia um projeto
que visará a prorrogar um contrato que o Legislativo decidiu
que seria improrrogável quando foram criados os pólos
rodoviários (em 1996). Essa discussão já se
exauriu. Prorrogar o contrato sem saber as necessidades futuras das
rodovias é, no mínimo, temeridade.
Pioneiro:
E é ilegal?
Gravina:
Estou com os administrativistas. Não
havendo previsão da possibilidade de prorrogação
no edital de licitação e no contrato, esse contrato
será improrrogável. Veja como se pode interpretar isso:
Abre-se uma licitação por 15 anos, alguém faz um
estudo e diz: "Se fosse por 25 anos, eu entraria (na concessão).
Por 15, não dá". E aí a licitação
é levada a efeito. No meio do contrato, esse empresário
fica sabendo que o prazo foi dilatado. "Ora", ele vai
dizer, "por 25 anos, teria feito proposta!"
Pioneiro:
Como se pode corrigir as atuais distorções dos
contratos?
Gravina:
Ou a administração está
estruturada para gerenciar isso, ou então que não se
aventure em concessões. O governo precisa ter um órgão
competente para compatibilizar essas questões. Não é
a Assembléia, por discursos, que vai administrar o pólo
de concessão, analisar questões tarifárias,
discutir o equilíbrio. É um desafio à
administração, que deve compatibilizar os serviços
que julga necessários dentro da possibilidade de pagamento do
usuário, para tornar a tarifa módica.
Pioneiro:
Para sanar prejuízos das concessões e tornar a tarifa
módica, o Estado pode, se for o caso, subsidiar os pedágios?
Gravina:
Em todo serviço público
que fugir da modicidade, o Estado precisa ter participação
para não permitir que só o usuário pague a
conta. Se não fosse cobrado do usuário (o pedágio),
quem pagaria integralmente essa conservação seria o
Estado. segue
( jaisson.valim@jornalpioneiro.com.br
)