Pedágios do Rio Grande do Sul

Jornal Pioneiro 22 de junho de 2005

Estradas

'O contrato parece dúbio'


Representante da Univias diz ser impossível concessionária instalar praça na Rota do Sol sem investir na rodovia

Porto Alegre - O presidente da Associação Gaúcha das Rodovias Concedidas (AGCR), Sérgio Coelho, acompanhou de perto as divergências no Pólo Rodoviário de Caxias do Sul, que até já resultaram, por determinados períodos, em fechamentos judiciais de praças. Ele dirigiu, até o início deste ano, o consórcio Univias, que administra a concessionária Convias. E, da experiência, formulou a receita para amenizar as polêmicas: discussões técnicas, sustentadas por estudos, e não por argumentos passionais.

Coelho admite que o contrato de concessão não deixa clara a responsabilidade da concessionária em conservar a Rota do Sol, se a praça for instalada no local. Mas assegura que a empresa fará a manutenção do trecho caso o pedágio seja implantado. Por telefone, ele conversou com o Pioneiro na última sexta:

Pioneiro: Em sete anos, ainda não se cumpriram os contratos, e os usuários se queixam da alta tarifa. Por que as concessões não deram certo?

Sérgio Coelho: As concessões deram muito certo. Apesar do descumprimento de contrato, das paralisações de cobrança e de outras perdas de receita, as concessões cumpriram seu papel, superando o padrão de qualidade previsto e garantindo que o Estado não tivesse um apagão nas estradas. Existem problemas, como esse passivo. O usuário paga, mas não se conseguiu executar a metade dos investimentos. Houve, por parte da concessionária, um esforço muito grande em manter as rodovias, com investimentos muito inferiores aos previstos, em razão da arrecadação abaixo do previsto. O problema com o qual deparamos é que o usuário não recebeu as explicações. Há uma omissão total.

Pioneiro: Foi por essa omissão que a Convias não recebeu o que deveria?

Coelho: Grande parte está representado por essa omissão. Tivemos um governo que lutava para extinguir a principal praça do pólo (de Caxias). Não dá para entender como um governo trabalha contra um Estado. Na hipótese de que ele tivesse se saído vencedor da tese, a praça de Farroupilha teria sido eliminada, o governo que cometeu eventualmente o equívoco teria que indenizar a concessionária, e o Estado seria penalizado. Já o governo seguinte não fez sua parte ao tentar resolver conflitos e informar a sociedade. Vivemos um festival da omissão.

Pioneiro: O governador Germano Rigotto tem dito que não amplia prazo de concessão, não fecha desvios, não muda praça de lugar nem aumenta a tarifa. De que forma, então, pode ser garantido o equilíbrio econômico-financeiro estipulado no contrato?

Coelho: Gostaria de ouvir o governo a respeito. Trabalhei nos últimos 10 anos em programas de concessão no Brasil inteiro, mas não sei fazer esse tipo de milagre. Existe um caminho, da transparência e do estudo técnico, que precisa tomar o lugar da emoção e da desinformação. Se não for assim, não consigo encontrar outra solução dentro do acertado compromisso do governador Rigotto de que, no Estado, cumprem-se os contratos. Mas nada impede que os contratos sejam reestudados, a sociedade seja esclarecida e que, com coragem, façamos o enfrentamento da falta de recursos.

Pioneiro: O estudo da Agergs aponta que, mesmo se a concessionária Convias vivesse em um cenário ideal, sem nenhuma perda com isenções, com o uso de desvios e com paralisações judiciais, ainda não teria tido a receita prevista pelo contrato. Os valores não foram superestimados?

Coelho: Não. Esse negócio tem risco. Alguns teimam em dizer que deram as rodovias prontas. Não! As rodovias estavam prontas, mas muitas delas, como a BR-116, em condições precárias. A RS-122, com as paralisações de cobrança, exigiu muito mais investimento do que o previsto. A diferença entre o crescimento da economia previsto e o que houve é risco da concessionária. Isso não é repassado à tarifa. A lei não permite.

Pioneiro: Representantes de usuários questionam por que as concessionárias desejam ampliar o prazo de concessão se não têm o contrato cumprido. Como isso ajudaria no restabelecimento do equilíbrio?

Coelho: Com um prazo maior, você tem a possibilidade de recuperar o capital investido. Isso permite um valor menor de tarifa. Nós não podemos repassar eternamente os desequilíbrios para a tarifa.

Pioneiro: A ampliação de prazo não vai contra a lei das licitações? Alguma empresa, por exemplo, pode ter deixado de participar da primeira concorrência por não ter se interessado pelo prazo de 15 anos.

Coelho: Não. O arcabouço legal nesse sentido é o caso do pólo de Pelotas, que hoje está com 27 anos (previstos), inclusive com acréscimo de novos trechos e novas praças. A lei acompanha o dinamismo das necessidades futuras. Mas a alteração precisa observar a legislação, que é o equilíbrio econômico-financeiro, tanto do usuário, quanto do investidor. Há regramento legal.

Pioneiro: Se for aumentado o atual prazo de concessão, o projeto vai estimar o tráfego futuro na rodovia e as possíveis melhorias necessárias não originalmente previstas no contrato de 15 anos?

Coelho: Esses estudos foram feitos pelas concessionárias. Não podemos ir para essa realidade sem antes discutir a questão, porque é preciso dizer para o usuário quem absorve esse aumento.

Pioneiro: O pedágio na Rota pode ser negociado?

Coelho: Tudo que está no contrato pode ser negociado dentro da lei. Basta que, em tempo hábil, procurem-se alternativas. Você precisa manter equilíbrio entre receita e despesa. Está na lei: ninguém pode enriquecer à custa do outro, em qualquer tipo de contrato. Então, temos a possibilidade de chegar a entendimentos e tomar outras medidas - desde que haja equilíbrio na decisão.

Pioneiro: E como se poderia se dar esse equilíbrio? Com aumento de tarifa ou iniciativa nesse sentido?

Coelho: É preciso verificar se (a extinção da praça) causa impacto. Em vez de a gente discutir se vai ter ou não vai ter, o mais coerente seria analisar a repercussão, se interessa ou não, se isso não iria até promover um barateamento da tarifa gerais do pólo. Isso precisa estudo técnico, e não discussão emocional e inflamada.

Pioneiro: Essa praça significaria também a manutenção do trecho entre Caxias do Sul e Apanhador?

Coelho: (pausa) Entre Caxias e Apanhador? Sim, provavelmente sim.

Pioneiro: No objeto do contrato, isso não consta.

Coelho: Embora até o contrato me pareça um pouco dúbio nessa questão, não tem isso. Como é que vou botar uma praça num trecho e não ter nenhum investimento nele? Impossível. Se isso não está claro no contrato, precisam ser definidas claramente as obrigações.


Saiba mais

A concessionária Convias arrecadou, nos sete anos de concessão, o equivalente a 57,8% do previsto e investiu 67,7% do exigido pelo contrato

Pelo estudo da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), a concessionária Convias contabilizou uma perda de R$ 101,3 milhões, em valores atualizados, em função dos desvios, isenções oferecidas pelas concessionárias, benefícios oficiais e paralisações judiciais nos últimos quatro anos

Por decisão judicial, a praça de Farroupilha, que corresponde a 64% da arrecadação de todo o pólo de Caxias do Sul, ficou fechada por mais de dois anos, entre 1998 e 2002. Na gestão do governador petista Olívio Dutra (1999-2002), a posição oficial defendia a ilegalidade em função de a Assembléia Legislativa não ter aprovado a instalação da praça, incluída apenas no edital de licitação. O argumento usado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) para permitir a retomada da cobrança, em novembro de 2002, foi que, ao incluir o praça na lei que instituiu a bidirecionalidade nos pedágios gaúchos, o governo acabou por legalizá-lo.

Mesmo se não houvesse qualquer perda no pólo de Caxias nos últimos quatro anos, a Convias teria arrecadado 91,34% do estimado